“Vai dar entrada na linha número um, o comboio Intercidades
com destino a Porto-Campanhã”.
Desligou o microfone após anunciar o comboio. Mais um dos
muitos que anunciava diariamente.
Limpou o suor da cabeça calva. O dia estava quente e a única
aragem fresca era provocada pelos comboios sem paragem que passavam a toda a
velocidade.
Costumava ficar a olhar para eles até desaparecerem na curva
da linha férrea. Secretamente desejava que o levassem.
“Pára! Deixa-me embarcar! Deixa-me partir contigo e abandonar
esta vida monótona!”
As campainhas já tocavam anunciando que o comboio se
aproximava. Pegou na bandeira vermelha e dirigiu-se à plataforma.
As pessoas juntavam-se e esperavam ansiosamente pela chegada
do comboio.
Ele perguntava-se que sítios iriam visitar, que aventuras
iriam viver, que histórias iriam colecionar.
A sua vida estava estagnada. Um emprego que o deprimia, um
salário parco, um velho apartamento perto da estação, um coração vazio.
Queria algo novo. Esta não era a vida que desejava. Desejar
era tudo o que fazia mas sem réstia de esperança.
- Desculpe…
A voz feminina despertou-o da melancolia.
- Por favor, fique com isto. Percebi que a minha vida,
afinal, começa aqui.
A mulher loira esticou-lhe um papel, sorriu e correu para
junto de um homem que beijou apaixonadamente.
Ele olhou o papel na sua mão. Os seus olhos abriram-se
surpresos.
Nas suas mãos tinha um bilhete com destino ao Porto no
comboio que acabava de parar na estação.
Poderia esta ser a sua oportunidade?
Aquilo por que tanto ansiava estava na sua mão. Não tinha
nada a perder.
O ar quente que emanava do comboio não o deixou sonhar mais
alto. Tinha de entregar o bilhete na bilheteira.
Observou a plataforma. As últimas pessoas subiam para o
comboio. O comboio das aventuras, dos sonhos, da esperança, da vida.
E ele ia ficar ali, a ver a sua vida passar sem chegar à
próxima paragem.
Estava na hora de levantar a bandeira e deixar o comboio
partir.
Apertou-a com força nas suas mãos. Largou-a, deixando-a
cair.
Entrou no comboio, sentindo a porta fechar-se nas suas
costas.
A vida era ele que a traçava.
No bolso apenas a carteira e o telemóvel.
Na mão o seu bilhete dourado.
No coração a excitação de um recomeço.
A viagem da sua vida estava prestes a começar.
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